quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Uma mulher que não se mede aos palmos


Mora na Torre, freguesia de Casais, uma das mulheres mais baixas de Portugal. Maria Rosa Lourenço, carinhosamente apelidada pelos habitantes daquela aldeia como “Rosita” tem 76 cm de altura mas uma garra fora do comum. E foi sem complexos que falou com “O Templário” desvendando que a sua baixa estatura não é entrave para que todos os dias tome conta da Mariana, a sobrinha-neta de 20 meses e que, curiosamente, já é mais alta do que ela.


Foi na sala de casa da sua irmã, onde vive na Torre, que nos pusemos à conversa com Maria Rosa Lourenço, de 51 anos. Apoiada com a bengala, a nossa entrevistada sentou-se no seu banquinho e a conversa fluiu durante mais de uma hora. Uma conversa franca e agradável onde nos deu a conhecer o seu dia-a- dia.
Há várias características que saltam à vista nesta mulher que derivado a uma doença congénita - devido ao facto dos pais serem primos em primeiro grau – só cresceu até aos 76 centímetros de altura. A boa memória, o discurso com detalhes, a vivacidade do olhar aliada a uma grande simpatia fazem dela uma excelente interlocutora.
É a filha mais nova de cinco irmãos (três já falecidos), e a única que nasceu com problemas, facto que levou a mãe, “Ti Beatriz”, actualmente de 84 anos, a tentar protegê-la do mundo exterior. “Havia aquelas ideias tontas dos pais antigos de que se os filhos não estivessem com eles podiam morrer pelo que só fiz a 4.ª classe porque uma professora da minha irmã mais velha (D. Laurinda) insistiu muito com ela e lá fui”, explica.
Actualmente lamenta que já não consiga movimentar-se como dantes, fruto dos 18 quilos que engordou nos últimos dez anos (actualmente pesa 52 quilos quando devia pesar 34 kg) pelo que evita sair de casa. “Ainda no outro dia a minha sobrinha convidou-me para irmos andar uma volta aqui mesmo na terra mas eu disse que não. Quando saio tem que ser numa cadeira de rodas porque já me custa muito andar. Sei que devia ter mais cuidado com a alimentação mas há dias que como mesmo muito pouco”, acrescenta.
Mas não é isso que a impede de tomar conta da pequena e enérgica Mariana, a sobrinha-neta de 20 meses, fazendo-o desde os 4 meses de idade desta. “Já tinha tomado conta da mãe dela, a minha sobrinha Tânia que vai fazer 30 anos, até ela ter entrado para o jardim-escola e agora estou a tomar conta da filha”, revelou.
E Rosita faz tudo o que qualquer pessoa que toma conta de uma criança faz, desde mudar a fralda até dar a papa. E fá-lo bem porque quem olha para a doce Mariana para além de ver uma criança bonita, vê uma criança muito esperta e desenvolvida para os seus 20 meses.
Madrugadora, Maria Rosa acorda todos os dias às 06h40 para cuidar das suas galinhas. “Quando a Mariana aqui chega já tenho tudo tratado”, conta. “Faço tudo o que qualquer pessoa faz. Pego nela e ponho-a na cadeira para lhe dar o comer. Aqueço a comida no microondas que está em cima de uma cadeira. Mas quando era mais bebé eu é que a deitava no sofá ou na cama”, disse. Com quase dois anos, a pequena tem uma energia fora do comum e por isso, tal como qualquer outra criança, tenta subir para cima das mesas e até da máquina de lavar mas, até agora, Maria Rosa conseguiu, até agora, impedi-la sempre e tudo tem corrido bem. “Estou sempre em cuidados porque sei que tenho certas limitações… Mesmo quando ela está com a mãe estou de olho nela e estou sempre a avisar para ela ter cuidado”, esclarece.
Em relação à a sobrinha-neta, o seu amor e dedicação é mais do que evidente. “É muito querida e meiguinha e, apesar de pequenina penso que a Mariana já compreende as minhas dificuldades. Vai-me buscar a bengala se vê que a deixo cair e o meu banco e acho piada como é que ela já entende isso”, refere. “Fazer disto profissão, ou seja, se alguém me pagasse para fazer isto (cuidar de crianças) eu acho que não queria”, refere apesar de sentir que a menina ainda não tem a noção que tem uma tia muito pequenina.
“Tenho que andar sempre atrás dela. Agora, estou o dia todo com ela e isso requer muita energia mas faço com gosto”, diz. “Á tarde vou um bocadinho com ela para a varanda para nos distrairmos um bocadinho mas tenho receio porque se ela foge para a rua eu não a consigo apanhar… porque ela já corre mais do que eu”, diz.

Más-línguas não a perturbam

A viver numa terra com poucos habitantes, Maria Rosa sabe que nem todos vêem com bons olhos o facto de uma anã tomar conta de uma criança. Há, por isso, algum preconceito e má-lingua a circular mas isso não a afecta. “Ainda no outro dia vieram-me dizer que a Mariana ia para uma ama e a minha sobrinha não me tinha dito nada. Á noite até brinquei com ela sobre o assunto”, refere. Também um outro habitante da Torre insinuou que a criança poderia não estar tão desenvolvida como as outras meninos por estar a ser criada por ela.”Sei que o filho dessa pessoa ainda diz menos palavras do que a minha Mariana por isso não é por causa dela estar comigo que desenvolve menos”, aproveita para esclarecer, acrescentando que não liga a comentários preconceituosos.
Maria Rosa Lourenço demonstra ter uma personalidade forte e tenta fazer uma vida o mais normal possível. Em sua casa, todos os móveis e objectos são de dimensão normal e até a casa-de-banho ainda não sofreu alterações por causa da sua estatura embora no futuro a irmã preveja fazer algumas obras e fazer um “polivan” para lhe ser mais fácil tomar banho. Actualmente já não faz a lida da casa mas quando se podia mexer melhor fazia de tudo em casa, desde aspirar pó a lavar roupa no tanque. Apesar de tudo vai vivendo como melhor pode e sabe. E a sobrinha-neta Mariana empresta-lha muita cor aos dias. Por tudo isto, Maria Rosa Lourenço, a “Rosita da Torre” é uma mulher que, definitivamente, não se mede aos palmos, dando uma lição de vida a muita gente que, por muito menos, desiste de lutar pela sua felicidade.

(publicado no Jornal O Templário)

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