quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Centro histórico de Tomar sem viv’alma



Os centros históricos das cidades estão cada vez mais desertificados. A falta de estacionamento, a existência de prédios desabitados e o encerramento de muitas lojas contribuíram para afastar as pessoas das ruas antigas da cidade. Tomar não é a excepção à regra e, ao fim-de-semana, pouca gente se vê nas ruas.

“Abro a loja ao sábado à tarde mas nas ruas não se vê ninguém. Os pais vêm aqui passear com os meninos à Praça da República mas é só…”. O desabafo é do gerente da Nova Mobiladora Manuel Antunes, localizada na Rua Silva Magalhães, em pleno centro histórico de Tomar. “Esta zona está esquecida devido às políticas da câmara e porque não há uma união de comerciantes…Se fossemos unidos tínhamos força”, refere Manuel Mendes Antunes, que atribui parte da culpa desta situação à forma como a autarquia reorganizou o trânsito nesta parte da cidade. “Eu sempre fui contra fecharem o trânsito na corredoura e sinto que desde que o fizeram que o negócio ficou mais fraco”, refere, salientando que, na altura, quando a ACITOFEBA convocava reuniões para debater o problema não aparecia ninguém para participar.
Na sua opinião só a abertura de uma rua que permitisse o trânsito subir para o centro histórico é que faria com que as pessoas voltassem a movimentar-se no centro histórico.
Sebastião Nobre, arquitecto na câmara municipal de Tomar e um dos poucos moradores da Praça da República, reconhece que a desertificação dos centros históricos tem vindo a aumentar, muito por culpa do desenvolvimento da própria economia. “Isto acontece com todas as cidades de Portugal. Penso que, nos últimos dez anos, o centro histórico de Tomar perdeu cerca 2/3 dos seus habitantes. Isto também tem a ver com a questão do direito da propriedade. As casas que aqui estão não são recuperadas porque têm muitos herdeiros, ou seja, é de todos mas ninguém habita nelas, nem existe preocupação em investir nelas ou em arrendá-las”, explica o arquitecto que também aponta culpas ao rigor excessivo dos planos directores municipais (PDM’S). “Os chamados planos de salvaguarda prejudicaram o desenvolvimento dos centros porque não dão liberdade ao proprietários para fazer as obras que entenderem, ou seja, existe uma “carga” ditada pelos PDM’S e pelos planos urbanísticos e, caso não sejam encontradas soluções para isto, os núcleos morrem”.
Na opinião de Sebastião Nobre, o encerramento da Praça ao trânsito não veio prejudicar em nada a vida do centro histórico de Tomar: “Não fazia sentido os carros andarem à volta da Praça. Além disso, como actualmente está organizado, permite que os carros subam à cidade”, aponta o arquitecto camarário.
Opinião contrária tem Manuel Antunes. “Dei, numa ocasião, como alternativas abrir a Rua Alexandre Herculano para o trânsito automóvel poder subir em direcção ao centro histórico dado que só há trânsito a descer. Enquanto não houver uma rua a subir para núcleo histórico não há solução para este problema”, aponta o comerciante. “Já muita gente veio ter comigo para encabeçar uma lista para abrir a corredoura porque a minha ideia – e que tentava apresentar sempre que havia reuniões na câmara para fechar a rua – era que se deviam arranjar os passeios na corredoura e abrir a passagem para os carros se dirigirem para o parque atrás da câmara”, explicou, acrescentando que tal como funciona actualmente, o parque “não é viável”.

Muitas obras,
pouco estacionamento


As constantes obras em Tomar são outro dos motivos, segundo os comerciantes com quem falámos, que levam as pessoas a desaparecer das ruas do centro histórico. “No outro dia uns clientes meus disseram-me que cada vez que vêm cá é um caos por causa das obras. No outro dia, outro cliente entrou em Tomar às dez horas e entrou na loja as 12h45 porque não arranjou lugar para estacionar”, exemplificou. “Sei que também há muito cliente que quer entrar com o carro para dentro da loja mas é desesperante quando, por exemplo, estou aqui ao sábado à tarde e não vejo viv’alma nas ruas”, retorquiu ao nosso jornal.
Opinião muito parecida tem Afonso Rosa Franco que gere a Casa das Sementes, na Praça da República, há 46 anos. Em conversa que teve há poucos meses com “O Templário”, o comerciante lamenta a falta de locais para estacionar no centro histórico. “Já pensei em trespassar esta casa porque isto é um bico-de-obra que está aqui. Tenho clientes que vinham aqui com carros pesados para carregar sementes e que deixaram de vir porque são logo multados”, apontou.
Para Afonso Franco, a Praça da República de Tomar “está a morrer” lentamente. “A tendência disto é morrer…Penso que os comerciantes daqui acham todos o mesmo. Desde 1999 que tem sido a queda total. Um dia até disse ao presidente da câmara que ele era ‘o coveiro’ da praça”, retorquiu inconformado.

(publicado no Jornal O Templário)

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