quarta-feira, 23 de abril de 2008

Jogadoras sentem que têm “as pernas cortadas” no mundo do futebol

Atletas femininas abandonam cedo a carreira desportiva. Universidade, casamento, emprego ou mesmo discriminação são obstáculo para as mulheres que sonham em fazer carreira atrás de uma bola.

Alta, morena e de cabelo curto, Tânia Arsénio, 19 anos, é uma jovem atleta que apesar de ser parca nas palavras sabe meter o dedo na ferida. “Ás vezes as pessoas vão ver um jogo de futsal feminino não é por gostarem do desporto mas sim para ver se as mulheres também se desenrascam a jogar”, aponta. “O que acontece, quase sempre, é que acabam por gozar com certas situações inerentes ao próprio desporto”, lamenta a O MIRANTE.

A atleta, guarda-redes da Associação Desportiva Fazendense (ADF) desde há quatro anos, foi convocada a 10 de Dezembro de 2004, para integrar a Selecção Nacional Sub-18. Como tal, participou num estágio de três dias no Centro de Estágios e Formação Desportiva de Rio Maior onde participou em várias sessões de treinos. Apesar da experiência ter ficado por aí, Tânia Arsénio não esquece aqueles dias. “Apesar de futebol de 11 ser diferente do futsal a experiência é enriquecedora e aprende-se imenso nos dias que lá estamos”, salienta a jovem que, curiosamente, deu os primeiros passos na actividade desportiva a jogar andebol.

Tânia Arsénio considera que em Portugal não há espaço para as mulheres que querem prosseguir com uma carreira no desporto. “Profissionalmente não acredito no nosso país. Sei que vou ter que conciliar com a minha actividade profissional com o futsal pelo que quero tirar um curso na área de gestão hoteleira e turística”, explicou a O MIRANTE, deixando uma ressalva: “É uma pena o país não investir mais no desporto feminino… Está a perder muitos talentos que podiam dar muitas alegrias aos portugueses”. Também a atleta da equipa de futsal feminino do Clube Desportivo do Cartaxo, Joana Gomes, 17 anos, que já conta com três chamadas à selecção, é da opinião que Portugal não investe no desporto feminino. “Em muitos clubes as equipas femininas são as primeiras a acabar assim que surgem dificuldades financeiras. Além disso como não há muitas equipas torna-se difícil organizar campeonatos femininos”, argumenta a jovem guarda-redes que equaciona a hipótese de fazer vir a fazer carreira no futebol fora do país.

Dina Lourenço, actualmente com 22 anos, foi convocada pela primeira vez para a Selecção de futebol Sub-19 em Março de 2002. Era nessa altura jogadora da equipa de futsal feminino do Clube Desportivo do Cartaxo. Os treinos no estágio correram bem, o seu talento para as lides da bola foi reconhecido pelo que chegou a participar em 4 jogos ao serviço da selecção das quinas. “A experiência foi muito boa, conhecemos pessoas de todo o país e aprendemos bastante nesses dias”, disse a O MIRANTE.

Cinco anos volvidos, a atleta a quem era reconhecido um grande potencial enquanto jogadora encontra-se a trabalhar como operária numa fábrica de processamento de carnes na Zona Industrial de Santarém. “Em Portugal é muito difícil para as mulheres fazerem carreira no futsal ou no futebol porque temos que trabalhar e treinar ao mesmo tempo enquanto que em alguns países as mulheres já têm a oportunidade de fazer isto profissionalmente”, testemunha a atleta. Apesar de estar empregada, Dina Lourenço continua a treinar três vezes por semana ao serviço do Carnide Clube, em Lisboa. “Muitos vezes saio do trabalho e nem passo por casa, vou directa para Lisboa para poder treinar”, explica a jovem, lamentando que em Portugal não se aposte no futebol feminino. “Eu gostava muito de continuar a jogar futsal mas…”, deixa no ar a questão.

Futsal feminino sem Selecção

Para José Carlos Marques, treinador de uma equipa feminina da Escola de Futebol de Tomar são vários os factores que levam as mulheres a abandonar a prática da modalidade. “Pela minha experiência, reconheço que a maioria das minhas atletas abandona por volta dos 18 anos quando entra na Universidade porque se torna difícil conciliar. As que vão ficando, a certa altura, sentem que são muito velhas em relação às restantes jogadoras da equipa cuja é de idades é 16-17 anos”, explica o técnico que reconhece a falta de oportunidades que existem para as mulheres. “Outra das dificuldades será quando nasce um filho uma vez que tem que se dar o abandono total da prática desportiva”, aponta o técnico tomarense que aponta que a maioria fica, no máximo, até aos 23 anos.
Apesar de, neste momento, o Futsal ser o desporto colectivo mais praticado por mulheres em Portugal, é o único que não têm campeonato, nem Selecção Nacional uma vez que a mesma acabou, a mando da Federação Portuguesa de Futebol. “Para além de não ser fácil profissionalizar-nos no nosso país, ainda decidiram acabar com a selecção nacional de futsal feminino o que é uma estupidez porque existem tantos talentos a nível de futsal feminino que a federação está a desperdiçar”, defende Tânia Arsénio que aproveita para informar que, desde Dezembro de 2007, circula uma petição on-line (http://seleccaonacional-peticao-online.nireblog.com) com vista à reactivação da Selecção Nacional de Futsal Feminino.

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