segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Mãe – coragem dá vida pelo filho




Ana Antunes escreve aos 23 anos a passagem mais delicada da sua jovem vida. Prepara-se para doar parte do fígado ao seu filho David, de 8 meses, a quem foi diagnosticada uma cirrose hepática. É a única maneira de salvar o seu menino. Uma história comovente que se passa numa aldeia do concelho de Ferreira do Zêzere.


Foi na pequena aldeia de Alqueidão de Santo Amaro que encontrámos Ana Antunes, a mãe que amanhã, 16 de Março, vai ser internada no Hospital Pediátrico da Universidade de Coimbra para submeter-se a uma delicada intervenção cirúrgica que vai salvar a vida do filho de apenas oito meses. Ana, de 23 anos, prepara-se para doar parte do fígado, um órgão que acabará por se regenerar naturalmente, para tratar a cirrose hepática de que sofre o bebé que deu à luz a 20 de Junho de 2005, depois de várias horas de trabalho de parto.
David Tiago é o primeiro filho de Ana e Nuno Miguel. O casal não planeou a gravidez que, no entanto, foi bem-vinda. “Nunca pensei que tivesse que passar por isto. Não foi uma gravidez planeada. Andávamos a tentar, se o bebé viesse… vinha”, começou por explicar a “O Templário”.
Uma gravidez de 40 semanas e 4 dias que a jovem ferreirense viveu sem sobressaltos nem angústias. “Foi uma gravidez normalíssima, sem problemas, nem enjoos”, atestou, salientando que só sofreu nas horas que antecederam o parto, no Hospital Bissaya Barreto, em Coimbra. “Estive muitas horas para o ter e teve que ser com ventosas”, explicou. Ali esteve com o bebé internada 4 dias, como é habitual em todas as recém-mamãs, até receber alta.
Os primeiros sinais da doença do David surgiram estavam duas semanas depois nascimento. “Começou-se a fazer amarelo e fiquei aflita. Fui ao Centro de Saúde, onde estava a ser acompanhada pelo médico de família, que me aconselhou a expor o bebé à claridade porque era icterícia e, em princípio, depois passava”, relatou. Mas, contrariamente à informação médica, o problema não só não passou como se foi agravando cada vez mais. “Passou um mês e sete dias, vi que ele estava cada vez mais amarelo pelo que fui à pediatria do Hospital e ali disseram-me que era hepatite”, recorda Ana Antunes. Uma notícia que quase fez ruir o seu mundo. “De hepatite a doença evoluiu para cirrose e agora só o transplante o salvará”, lamenta.
Questionada sobre as causas desta doença no seu filho, Ana Antunes, que também procurou saber o mesmo refere que a médica lhe adiantou uma explicação mas que até pode nem ser a real causa da doença. “Disseram-me que os bebés tanto vão buscar células boas como más… ele foi buscar as más”, refere.


Operação delicada


Quem observa o pequeno David Tiago a dormir serenamente, enrolado a um cobertor, não se apercebe que sofre desta doença. “Ele é um bebé que sempre foi muito mexido. Se ouvir vozes olha logo na direcção do som e quer agarrar nas coisas, apesar de não ter forças nas pernas nem nos braços porque o corpo quando não tem proteínas suficientes vai buscá-las a esses membros. Mas de resto quem olha para ele diz que é um bebé normal e que não tem doença nenhuma”, conta enquanto olha para o rebento.
A jovem mãe está consciente do risco de vida que ambos correm mas não pensou duas vezes assim que a médica a informou que era dadora compatível e lhe perguntou se queria dar parte do fígado ao filho. “Quando esteve internado esta última vez, entre 31 de Janeiro e 27 de Fevereiro, a médica disse-me que ele, para se salvar, tinha que ser transplantado o mais rapidamente possível. Perguntou-me qual era o meu grupo sanguíneo, fiz todas as análises e exames necessários e, já depois de ter os resultados, a médica conversou comigo. Depois disse-me que eu era compatível e perguntou-me se podia doar um pedaço do meu fígado para o salvar. Eu disse logo que sim porque sei que o meu filho não pode estar mais tempo na lista de espera porque a situação agrava-se muito mais”, relatou Ana Antunes ao nosso jornal. “Sou mãe e quero que ele continue com a vida dele para a frente”.
No dia 16 de Março, Ana Antunes, vai ser internada no Hospital pediátrico de Coimbra, único local do País onde se realiza este tipo de transplante, para tentar salvar a vida do seu filho. “Ainda não sei a data da operação, mas a partir desse dia pode realizar-se a qualquer momento”, disse. Ana está consciente de que será uma operação delicada e que a taxa de sobrevivência de pacientes sujeitos a transplante com dador vivo é superior a 90 por cento. “É uma operação muito delicada, muito morosa e tem vários riscos associados, como a possibilidade de se dar um derrame – é bom a gente nem pensar nisso. Há também o risco de ele rejeitar o fígado, já depois da operação. Era bom que não, que tudo corresse bem”, desabafa, revelando-se uma pessoa positiva.
Uma luta que já conheceu um primeiro ensaio a 7 de Março, quando Ana Antunes se deslocou aos Hospitais da Universidade de Coimbra para ser internada. “Mandaram-me para casa mais uma semana para que ele ganhasse mais forças mas eu não me importava de já ter ficado lá e fazer a operação no outro dia. Para mim quanto mais depressa ele fizer a operação melhor”, referiu.
“Há muita gente que chega aqui ao pé de mim, para me dar apoio, e chora. Não chorem. Lutem pela vida, como eu estou a lutar pela vida do meu filho”, reforça esta mãe – coragem.

(publicado na edição n.º 951 do Jornal O Templário a 15 de Março de 2006)

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