sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Dorme num carro mas almoça todos os dias no restaurante


Desgosto de amor levou-o a deixar de cortar a barba há 35 anos. Virgílio Silva tem duas casas e três carros, embora nenhum funcione, e optou por viver e dormir num deles.

Há vidas que davam um filme. A de Vírgilio Silva, morador no lugar de Roda Grande, freguesia da Asseiceira, Tomar é uma delas. Este homem de 67 anos, lúcido, bem falante e com uma postura vertical, dorme num velho Renault Major , rodeado por um monte de silvas e sucata, que tem estacionado num terreno localizado no ermo da estrada principal do lugar, que comprou há 20 anos. Não gosta muito de falar nisso porque sente que a situação não o dignifica nem niguém o vai ajudar por isso. Refere que foram as circunstâncias da vida que o obrigaram a viver nesta situação. Independente monetariamente, todos os dias vai almoçar a um restaurante das redondezas. “Á segunda e à terça-feira almoço na Praia do Ribatejo e nos outros dias vou almoçar a Constância mas quando era permitido fazer lume eu fazia aqui o comer”, explica, deslocando-se nessas ocasiões numa scooter moderna. Quando comprou aquele pedaço de terra, a ideia era instalar ali uma oficina de pintura de automóveis – profissão que exerceu durante alguns anos - mas, segundo diz, os vizinhos não concordaram com a ideia, criando problemas com as extremas do terrado, argumentando que por causa da situação chegou a ser agredido. A Junta de Freguesia da Asseiceira quis realojá-lo numa ocasião mas Virgílio Silva não aceita uma vez que tem duas casas e diz que apenas precisava de dinheiro para as arranjar. “

Na Roda Grande, a poucos metros do local onde reside, tem ainda as duas casas que eram dos pais mas problemas relacionados com partilhas com uma irmã impedem-no de ali morar. A habitação que era dos pais não tem luz , ao contrário do que acontece dentro do carro onde vive, e segundo explica o telhado teria que sofrer obras de recuperação. “Ao menos aqui estou naquilo que é meu e sinto-me bem. Tenho a minha privacidade e não pago renda”, justifica, acrescentando que teve sempre uma relação difícil com o pai, a quem chama de “carrasco”. Recorda que quando precisou de um terreno para trabalhar em pintura de automóveis o progenitor opôs-se à ideia. “Tenho estacionado junto a essa casa um Ford V8 e queria fazer uma garagem para pôr lá o carro e até isso ele não me deixou fazer”, exemplifica.

Virgilio Silva foi pintor de automóveis, profissão que aprendeu, em 1954, com 13 anos, frequentando a antiga Base Aérea de Tancos durante seis anos, como aprendiz, não ganhando nada a não ser experiência profissional. “Ao fim desse tempo entrei para o quadro, como servente mas dois anos depois fui chamado para a tropa, entre 62 e 64”, conta que veio a sair da Força Áerea devido a divergências com um capitão que “o andava a perseguir”. Foi quando regressou à Roda Grande e começou a trabalhar em pinturas e, sempre que era preciso, cultivavba os campos com uma moto cultivadora.
Reformado desde 1982, acumula a reforma da Segurança Social com outra pensão de proveniente da Força Aérea, totalizando cerca de 450 euros mensais, o que lhe permite alguma estabilidade para o seu modo de vida. “Quando recebia só da Segurança Social mal dava para comer e nem roupa podia comprar, andava vestido com o que me davam.

O frio que não tem dado tréguas ultimamente parece ser indiferente a Virgílio Silva, que aparenta ter uma saúde de ferro. “Tenho duas lâmpadas de 60 watt no carro que me aquecem e alguns cobertores”, aponta. Reconhece que difícil é tomar banho de água fria, que no Verão toma num terreno de mangueira. “O frio é psicológico”, remata enquanto se prepara para tocar acordeão e saxofone, para aquecer o ambiente junto aquela que considera ser a sua casa.



Desgosto de amor origina longo cabelo e barbas

Há um motivo romântico que justifica as longas barbas que Vírgilio Silva exibe. Namorava uma moça, que queria levar honrada para o altar e respeitou essa honra durante 2 anos e sete meses. “Repudiou-me porque a mãe dela deu-nos uma omeleta de ovos para comer que estava feita para desligar amizades”, conta. Em 1974, quando tinha 26 anos, ouviu dizer que a amada tinha casado com outro. “Senti que me tinha sujado a cara e deixei de cortar a barba pela desonra que me fizeram”. Nunca casou ou teve filhos.

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