sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Artesão de Igrejas em miniatura em Santa Cita, Tomar




A igreja de Santa Cita, Tomar, localidade onde mora, foi a primeira que lhe nasceu das mãos. Foi há 17 anos. Henrique Marques, antigo serralheiro na Fábrica da Matrena, a dois quilómetros de sua casa, começou a fazer miniaturas de igrejas aos 59 anos, quando a vida, já algo amadurecida, lhe pregou a rasteira do desemprego, devido à falência da firma onde desde sempre trabalhou. “Quando a terminei deu-me um prazer de alma e coração”, recorda o artesão, agora com 76 anos mas desanimado, uma vez mais, com a crise que lhe faz escassear as encomendas. “Desde Julho que isto está muito parado. As pessoas dizem que não há dinheiro”. desabafa. Cada exemplar custa 35 euros. As miniaturas que guarda em prateleiras numa garagem em sua casa representam igrejas de concelhos diversos como Tomar, Ferreira do Zêzere, Ourém, Constância, Vila Nova da Barquinha, Entroncamento, Alcanena e Mação. As que ali se vêem não estão para a venda, servindo de molde para as que se seguem. Cada igreja é única e feita em Madeira do Futuro (MDF), levando várias camadas de verniz “para afastar a mosca” da madeira. Em tempos já sonhou em ter um museu para expor as suas miniaturas, num espaço cedido pela autarquia de Tomar ou até no edifício do Turismo, mas já não reúne essa ambição. Refere, no entanto, com orgulho que as suas igrejas estão à venda na Casa do Concelho de Tomar, em Lisboa e não esquece o tempo em que chegou a ir às escolas da região ensinar e mostrar o seu engenho aos mais pequenos. Para Henrique Marques, o valor da sua arte reside no simbolismo que carrega. “Diga-me lá se não é uma prenda bonita, a pessoa receber a miniatura da igreja onde casou ou baptizou os filhos?”, alvitra.

Artesão de moinhos de pedra em Moreiras Grandes



Quando se passa na estrada principal de Moreiras Grandes, no concelho de Torres Novas, torna-se quase impossível não reparar nos vários moinhos de vento, forrados a pedra lascada, que se encontram espalhados pelo jardim da casa de Eurico Brito, de 65 anos. O jeito para os trabalhos manuais sempre o teve. Não tivesse sido a sua profissão a de serralheiro cirúrgico, fabricando as peças que normalmente os médicos utilizam nas cirurgias. Por isso, o moinho que segura nas mãos é quase uma réplica perfeita dos originais que costuma observar pelos lados de Caldas da Rainha, terra onde nasceu. Há 30 anos, o coração levou-o a escolher viver nas proximidades de Torres Novas. Quando deixou de trabalhar, há cerca de cinco anos, a memória serviu de inspiração para começar a desenvolver esta peculiar forma de arte popular. O primeiro moinho que fez, de grandes dimensões, não o vende a ninguém. Diz que “está muito aldrabado”. Desde então, tem vindo a aperfeiçoar o trabalho e diz que já perdeu a conta aos que vendeu. A fórmula saiu da sua imaginação:“Bidons” de 200 litros servem de molde aos moinhos de grandes dimensões. Para os mais pequenos utiliza, por exemplo, as vulgares latas de leite condensado. Por fora aplica duas camadas de rede. Depois coloca uma massa, composta por brita, areia e cimento. As pedras são compradas numa pedreira e os pedaços são cortados consoante a dimensão do moinho em que se encontra a trabalhar. Um funil de lata, moldado pelas suas mãos, serve de telhado e um peso improvisado em cimento segura a vela, feita de material plástico que é mais resistente uma vez que, normalmente, estas peças servem para decorar espaços exteriores, como jardins ou varandas. Um regulamento engenhado com esferas faz mover a vela de forma natural com o vento. Eurico Brito faz os moinhos por encomenda e os preços variam entre os 50 e 250 euros. “Se pudesse ficava com todos para mim uma vez que aqui estão muitas horas de trabalho”, confessa o artesão orgulhoso na sua arte.

Dorme num carro mas almoça todos os dias no restaurante


Desgosto de amor levou-o a deixar de cortar a barba há 35 anos. Virgílio Silva tem duas casas e três carros, embora nenhum funcione, e optou por viver e dormir num deles.

Há vidas que davam um filme. A de Vírgilio Silva, morador no lugar de Roda Grande, freguesia da Asseiceira, Tomar é uma delas. Este homem de 67 anos, lúcido, bem falante e com uma postura vertical, dorme num velho Renault Major , rodeado por um monte de silvas e sucata, que tem estacionado num terreno localizado no ermo da estrada principal do lugar, que comprou há 20 anos. Não gosta muito de falar nisso porque sente que a situação não o dignifica nem niguém o vai ajudar por isso. Refere que foram as circunstâncias da vida que o obrigaram a viver nesta situação. Independente monetariamente, todos os dias vai almoçar a um restaurante das redondezas. “Á segunda e à terça-feira almoço na Praia do Ribatejo e nos outros dias vou almoçar a Constância mas quando era permitido fazer lume eu fazia aqui o comer”, explica, deslocando-se nessas ocasiões numa scooter moderna. Quando comprou aquele pedaço de terra, a ideia era instalar ali uma oficina de pintura de automóveis – profissão que exerceu durante alguns anos - mas, segundo diz, os vizinhos não concordaram com a ideia, criando problemas com as extremas do terrado, argumentando que por causa da situação chegou a ser agredido. A Junta de Freguesia da Asseiceira quis realojá-lo numa ocasião mas Virgílio Silva não aceita uma vez que tem duas casas e diz que apenas precisava de dinheiro para as arranjar. “

Na Roda Grande, a poucos metros do local onde reside, tem ainda as duas casas que eram dos pais mas problemas relacionados com partilhas com uma irmã impedem-no de ali morar. A habitação que era dos pais não tem luz , ao contrário do que acontece dentro do carro onde vive, e segundo explica o telhado teria que sofrer obras de recuperação. “Ao menos aqui estou naquilo que é meu e sinto-me bem. Tenho a minha privacidade e não pago renda”, justifica, acrescentando que teve sempre uma relação difícil com o pai, a quem chama de “carrasco”. Recorda que quando precisou de um terreno para trabalhar em pintura de automóveis o progenitor opôs-se à ideia. “Tenho estacionado junto a essa casa um Ford V8 e queria fazer uma garagem para pôr lá o carro e até isso ele não me deixou fazer”, exemplifica.

Virgilio Silva foi pintor de automóveis, profissão que aprendeu, em 1954, com 13 anos, frequentando a antiga Base Aérea de Tancos durante seis anos, como aprendiz, não ganhando nada a não ser experiência profissional. “Ao fim desse tempo entrei para o quadro, como servente mas dois anos depois fui chamado para a tropa, entre 62 e 64”, conta que veio a sair da Força Áerea devido a divergências com um capitão que “o andava a perseguir”. Foi quando regressou à Roda Grande e começou a trabalhar em pinturas e, sempre que era preciso, cultivavba os campos com uma moto cultivadora.
Reformado desde 1982, acumula a reforma da Segurança Social com outra pensão de proveniente da Força Aérea, totalizando cerca de 450 euros mensais, o que lhe permite alguma estabilidade para o seu modo de vida. “Quando recebia só da Segurança Social mal dava para comer e nem roupa podia comprar, andava vestido com o que me davam.

O frio que não tem dado tréguas ultimamente parece ser indiferente a Virgílio Silva, que aparenta ter uma saúde de ferro. “Tenho duas lâmpadas de 60 watt no carro que me aquecem e alguns cobertores”, aponta. Reconhece que difícil é tomar banho de água fria, que no Verão toma num terreno de mangueira. “O frio é psicológico”, remata enquanto se prepara para tocar acordeão e saxofone, para aquecer o ambiente junto aquela que considera ser a sua casa.



Desgosto de amor origina longo cabelo e barbas

Há um motivo romântico que justifica as longas barbas que Vírgilio Silva exibe. Namorava uma moça, que queria levar honrada para o altar e respeitou essa honra durante 2 anos e sete meses. “Repudiou-me porque a mãe dela deu-nos uma omeleta de ovos para comer que estava feita para desligar amizades”, conta. Em 1974, quando tinha 26 anos, ouviu dizer que a amada tinha casado com outro. “Senti que me tinha sujado a cara e deixei de cortar a barba pela desonra que me fizeram”. Nunca casou ou teve filhos.