domingo, 21 de novembro de 2010

Só um jornalista entende outro jornalista

“Não se é jornalista seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês mas sim 24 horas por dia, mesmo estando desempregado”. Li esta frase, do jornalista Orlando Castro, quando estava no último ano do curso de jornalismo. Recordo de, na ocasião, a escrever e sublinhar como se de uma verdade incomensurável se tratasse. Oito anos mais tarde não tenho dúvidas de que só vence nesta vida que assim sente e age. Porque esta não é uma profissão. É um modo de estar na vida pública. O difícil nisto tudo é explicar aos outros, especialmente aos que escolheram ter uma profissão, que a missão de informar não se compactua muitas vezes com as suas regras, horários e rotinas. Como já me aconteceu, por exemplo, ligar para uma repartição pública às cinco da tarde e ninguém atender o telefone, tentar trabalhar num feriado e ninguém se disponibilizar para dar entrevistas nesse dia ou ligar para a Polícia por causa de um assalto e não há quem consiga dar informações porque “o chefe saiu” e só ele as pode dar. E como explicar a alguém que, mesmo estando de férias, a nossa vontade é sair a correr atrás do carro dos bombeiros porque auguramos que o acidente foi grave ou durante aquele jantar de amigos não nos deixamos contagiar pelas anedotas que contam porque temos a cabeça a fervilhar no caso que tratamos há poucas horas, pronta a sair pelas pontas dos dedos. Tenho a noção que só um jornalista entende outro jornalista, como só um médico entende um médico ou um jardineiro entende quem gosta de flores. Só outro jornalista consegue perceber porque trabalhamos aos feriados, fins-de-semana e, se for necessário, ficarmos agarrados ao computador pela noite dentro. Só outro jornalista, partilha o entusiasmo que imprimimos ao contar o que se passou naquela reportagem e nos retribui também contado enfaticamente o que lhe aconteceu de uma outra vez. Por isso, um funcionário público talvez considere que é uma chatice atender o telefone meia hora antes de sair, algumas pessoas considerem que têm mais que fazer do que aturar jornalistas num dia feriado e o agente policial que atende os telefones não quer extrapolar as suas funções mesmo que seja só para dizer a onde e a que horas foi o assalto.

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