segunda-feira, 8 de junho de 2009

História de um casamento multiracial




Nasceram em pontos diferentes do planeta mas conheceram-se numa discoteca em Torres Novas. Foi amor à primeira vista. Há seis meses trocaram votos eternos em Tomar.

Filha de pai russo e mãe ucraniana, Olesya Nezhdanova nasceu na Alemanha há 23 anos e tem nacionalidade ucraniana. Descendente de pais cabo-verdianos, Carlos Dias nasceu em Lisboa há 28 anos. Ela tem tez clara e olhos verdes. Ele tem pele escura e olhos castanhos. No dia 13 de Setembro de 2008 trocaram juras de amor eterno na igreja de São João Baptista, na Praça da República, em Tomar, cidade onde vivem há quatro anos, devido à jovem se encontrar ali a estudar. Olesya veio de Itália, onde vivia com familiares, para Portugal, para junto da mãe que vivia em Torres Novas e que para aqui emigrou há sete anos à procura de novas oportunidades.

O casamento demorou um ano a preparar e seguiu-se após um romântico pedido de joelhos feito em pleno restaurante na noite em que comemoravam três anos de namoro. O casal já vivia debaixo do mesmo tecto há dois anos. Mas o amor surgiu mais cedo, à primeira vista, numa discoteca em Torres Novas, onde Carlos estava a trabalhar ocasionalmente para conseguir juntar algum dinheiro. Já tinham sido apresentados por amigos há algum tempo mas o contacto perdeu-se. Nessa noite deu-se um clique. “Todos perceberam, logo nessa noite, que estávamos apaixonados”, recorda Olesya. As familias de ambos aceitaram bem a relação. “A minha mãe não adora… ama o Carlos”, aponta radiante.

O casamento de Olesya e Carlos teve direito a cerimónia religiosa (sem missa) e na boda deu-se uma junção entre as culturas ucraniana, portuguesa e cabo-verdiano. “ A minha religião é ortodoxa, ele é católico mas a igreja não viu problemas em casar-nos. Apenas tive que confirmar que era baptizada”, explica a jovem. A cerimónia, sem missa, pautou-se pela simplicidade. Seguiu-se a boda numa unidade hoteleira junto ao rio Nabão. Ela teve duas madrinhas, ele teve um casal de padrinhos. Ao todo eram 70 convidados. Olesya teve pena que algumas das suas amigas da Ucrânia não pudessem vir, tanta foi a burocracia exigida para conseguir obter o visto. “Até fotografias nossas tive que enviar para comprovar que nos iamos casar mas mesmo assim não consegui que viessem”, refere.

O vestido era simples, constituido por corpete e saia. As alianças escolhidas são as mais tradicionais. Olesya conta algumas tradições de casamentos no seus país mas que, com muita pena sua, não tiveram lugar na sua boda, também porque não teve muitos convidados e os que se encontravam podiam não compreender. “Na Ucrânia raptam a noiva durante a festa e o noivo tem depois que a encontrar e bebem champagne do sapato ou da bota da noiva”, exemplifica. A Lua-de-Mel foi na Tunísia.

A história de amor deste casal e vivida sem preconceitos ou pertubações, mesmo quando estranhos constatam surpreendidos as diferenças físicas entre o casal. “Dizem-nos que somos muito diferentes mas muito parecidos ao mesmo tempo. Damo-nos muito, muito bem!”, aponta. Mais do que a cor da pele, Olesya e Carlos tiveram que aprender um pouco da cultura de cada um. Lá em casa é ela que cozinha, confeccionado muitos pratos típicos da gastronomia russa. Ele adora. Ela teve que se adaptar ao Natal da cultura portuguesa, uma vez que o seu é comemorado a 7 de Janeiro. No último, quando visitou a familia de Carlos em Lisboa, estranhou a comida africana condimentada mas confessa que cada vez gosta mais desta data.

Carlos Dias é militar em Tancos e Olesya finalista do curso de Gestão Turística e Cultural. Nos últimos sete anos estudou, trabalhou e tornou-se numa das melhores alunas da sua escola. A média de 17 valores torna-a na melhor aluna do Instituto Politécnico de Tomar, tendo sido distinguida recentemente pelo Rotary Club de Tomar pelo mérito alcançado.

A jovem ucraniana encontra-se a concluir a licenciatura do seu curso. Carlos vai deixar a tropa no próximo ano. Os filhos só selarão o amor deste casal multiracial quando encontrarem a estabilidade profissional e económica. Seja em qualquer parte do mundo.

Publicado na Edição de 02 de Abril de 2009

Antigo mecânico de Ourém restaura clássicos para a sua colecção particular




António Pereira, ex-imigrante em França, mora em Espite, Ourém e colecciona carros antigos, restaurando-os de raiz. Um hobbie que já ultrapassa as duas dezenas de viaturas e que lhe permite, todos os dias, sair com um clássico diferente para a rua.

Imigrou para França em 1959, trabalhando durante quarenta anos em oficinas de bate-chapas, perto de Paris, até se estabelecer por conta própria. Em jovem teve vários carros mas houve um modelo Ford Consul Classic 315 que o marcou. Mais tarde, viu numa revista de carros clássicos, um carro idêntico e resolveu comprá-lo. Depois de regatear o preço, acabou mesmo por ficar com o clássico. Meteu mãos à obra e recuperou o veículo de raiz, ficando como novo. Não era a primeira vez que António Pereira, actualmente com 65 anos, se metia em tais andanças pois já tinha recuperado carros antigos para o filho e para o genro. “Desde chaparia, à parte de mêcanica e acabamentos, faço a recuperação completa dos meus carros”, disse a O MIRANTE, acrescentando que antes de desmontar o veículo começa logo por fazer a lista das peças que precisa. As que não existem, uma vez que algumas viaturas que já recuperou remontam a 1923, não são obstáculo incontornável. “Umas faço-as, outras mando-a fazer ou vir do estrangeiro”, explica, acrescentando que já foi a Paris várias vezes, de propósito, à procura de peças. “Não fica um parafuso em cima do carro”, conta.

Numa divisão anexa à sua casa, no lugar de Espite, freguesia de Ourém, mostra a colecção que iniciou há 20 anos e que conta com 23 carros clássicos até ao momento, se bem que na forja já se encontra uma carrinha de 1927 para restaurar. As viaturas, que reluzem ao olhar, só vão para a estrada quando estão em condições. António Pereira anda, em praticamente, todos e por isso os clássicos encontram-se todos cobertos pelo seguro. Habitual frequentador de passeios de carros antigos da região, guarda em casa as memórias desses encontros, retratados em inúmeras fotografias, azulejos ou outras recordações. Ainda recentemente, recorda um passeio que aconteceu em Ourém e que culminou com a visita dos participantes à sua colecção. A esposa, Maria José, também o acompanha nessas ocasiões. “O que ele faz, faz bem”, atesta, habituada a ver o marido horas e horas de volta dos carros na oficina. “Nunca pensei em ter tantos carros assim seguidos mas, quando vou de férias a Paris, onde tenho família, vejo-os à venda e compro-os”, explica António Pereira, reconhecendo que este é um “hobbie dispendioso” e que só consegue manter devido a uma vida regrada noutros aspectos.

O antigo mecânico gosta de documentar fotograficamente todo o processo de recuperação para mostrar o antes e depois. “Os carros vêm num estado lamentável e só ficam valorizados depois de muitas horas de trabalho”, ressalva, explicando que primeiro que tudo começa por recuperar o motor do carro, passando posteriormente à parte mecânica, à carroçaria e, finalmente, aos acabamentos e pintura. Só os bancos e os estofos são montados por um profissional.
A estima que tem por cada um destes veículos é notória quando mexe neles e exemplifica como trabalham. Por isso tem dificuldade em dizer de qual gosta mais. “É como as mulheres, gosto delas todas”, dispara com uma sonora gargalhada.

Publicado na edição de 22 de Janeiro de 2009